quinta-feira, 22 de abril de 2010

Três poemas para Abril

I
Desgraçadamente nascemos nesse tempo,
crescemos tristemente
por dentro de anos tão ocos
quão cheios de pedras aceradas
e de vozes tantas vezes inaudíveis.
Que eu esqueça desses anos
o cheiro da pobreza,
o bolor das horas magoadas,
o medo, a cela, a incerteza
e apenas recorde o calor do sangue
lutando por correr,
lutando por achar o caminho da manhã.
Que o clamor das ruas de novo me visite
como então as visitei e percorri
com a morte em sentido contrário,
como então as visitei e percorri
em busca do sol
que no quarto mês do ano renasceu
vestido de vermelho.
Que o espanto de novo me visite,
nessas ruas onde a voz aprendeu a nomear
o que as palavras mais puras
desde sempre reclamaram:
o pão e a justiça, a liberdade
palavras tão gastas que dos versos
por estupido pudor, burgês, as exilaram.

João Pedro Mésseder


II
Eram canções de combate
e adolescente saíste à rua
a descobrir a segunda infância
de um país de sangue antigo
cujo nome, como o sangue
se tinha quase esvaído.

João Pedro Mésseder


III
Entre Abril e Novembro dias houve
em que caminhavas na rua como quem voa.
Confundiste a voz com outras vozes
e as mãos com outras mãos
mais fortes do que as tuas
e sujaste o rosto de terra
de óleo
e de suor.
Entre Abril e Novembro aprendeste a construir,
a iluminar os muros com palavras
e com formas de vida futura.

João Pedro Mésseder


P.S. Para meus pais e meu irmão José Manuel

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